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      A história do naturismo no Brasil está sendo contada em capítulos nas edições do OLHO NU. De autoria de Roberto Soares, naturista de longa data e aficionado pelo Movimento, que a relatou originalmente para ser publicado no livro Luz del Fuego - A Bailarina do Povo de Cristina Agostinho, Branca de Paula e Maria do Carmo Brandão (Editora Best Seller - 1994). Baseando-se no que foi publicado na imprensa em geral e em experiências e fatos vividos por ele próprio, Roberto começou sua trajetória a partir de Luz Del Fuego, que era o personagem central do livro, depois focalizou a famosa Dona Beja, e em seguida relatou as experiências difíceis para encontrar o Naturismo na época da Ditadura Militar, entremeando sua história pessoal com os fatos históricos. Nesta sétima parte, Roberto relata a descoberta da Praia do Pinho e a luta para transformá-la em praia de nudismo, com direito a prisões e hostilidade no início.

"Encontro com o Paraíso"

7º capítulo

Pinho, o paraíso encontrado

Por Roberto Soares*

 

     O ano de 1993, surgiu em meio às águas que ensoparam as comemorações de ano novo por todo o sul do Brasil; também choveu muito por todo o mês de janeiro, fazendo-me crer que tinha feito uma excelente opção por fevereiro para minhas férias. A contagem regressiva estava terminando, aproximava-se o dia esperado por trinta anos, de me tornar "naturista de carteirinha", de assumir pública e socialmente minha condição de propagador do Naturismo, não mais de um eventual participante, na maior parte das vezes colhido de surpresa, como fora por toda a vida.

     Poucos dias antes de ir, alguma coisa me dizia que seria prudente tomar algumas precauções; reli os dois números da revista Naturis, neles encontrando a indicação de um telefone de contato, para informações. Liguei, e acabei passando quase uma hora e meia conversando com a Rose, de Florianópolis, uma das primeiras pessoas a pegar sol em toda a pele na praia do Pinho. Ela e o marido Edo, têm uma casa em Balneário Camboriú, onde costumam passar boa parte de seu tempo livre; há mais de quinze anos, os dois percorreram toda a costa, nas proximidades do Balneário, à procura de uma praia onde pudessem curtir o sol, a brisa e o mar ao natural. Acabaram chegando à prainha que fica entre o morro da Tartaruga, atual localização do Paraíso da Tartaruga, sede da AAPP, Associação dos Amigos da Praia do Pinho, e a praia do Pinho, propriamente dita. Esta prainha está separada do Pinho, por um pequeno conjunto de rochedos, e é sazonal; ou seja, o mar traz e deposita a areia sobre as pedras, formando-a, mas alguns meses depois, alguma grande ressaca leva-a por inteiro.

     Ali, Rose e Edo curtiam o sol e o mar a sós; até que resolveram subir as pedras do sul da prainha, para ver o que havia daquele lado. Para surpresa dos dois, depararam com uma belíssima praia de enseada, de uns duzentos metros de extensão, que terminava ao sul, abruptamente, nos grandes rochedos que a separam do Estaleiro. A praia estava deserta, não havia caminho de acesso visível, os dois então correram nus e felizes pelas areias perenes e macias da praia do Pinho. Em outras vezes que voltaram, foram encontrando algumas outras pessoas, que vinham ali fazer o mesmo que eles, gozar a liberdade sem censura, como na música de Roberto Carlos: "...bronzear o corpo todo sem censura; gozar a liberdade de uma vida sem frescura..." E foram fazendo amizades, enquanto o grupo crescia.

     Descobriram um novo caminho, que era utilizado pelos outros, por cima da própria praia; só que ainda tinham que deixar os carros lá em cima, na estrada das praias, que liga Estaleirinho, Estaleiro, Pinho, Taquaras, Taquarinha e Laranjeiras; as praias do sul do município de Balneário Camboriú. Prosseguiam a pé, como acontece hoje com a praia do Olho de Boi, em Búzios, administrada pela RIO NAT**, também reconhecida pela FBN, Federação Brasileira de Naturismo.

     Amargaram também alguns ataques dos empregados do proprietário do terreno, Domingos Fonseca, que no início, espantados pela invasão daquela gente nua, atravessando as terras que cuidavam, tentaram rechaçá-las a paus e pedras. Com o tempo, o próprio seu Domingos veio ter com os nudistas, acabando por simpatizar com aquela gente que só queria um pouco de paz e liberdade. Depois, atraídos pela possibilidade de ganhar a vida vivendo num paraíso, devido à constante presença dos naturistas, uma das filhas de seu Domingos, Yvonete, com seu marido Álvaro, cansado dos percalços de sua profissão de caminhoneiro, resolveram fixar-se no local, e assumir um restaurante, construído em frente à atual entrada da praia.

     Abriu-se um caminho que permitia descer da estrada das praias, com o carro, até a praia do Pinho. No princípio, como em todos os princípios, as coisas não foram nada fáceis para os dois; viviam lá isolados do mundo, os naturistas não apareciam durante os invernos, as estradas de acesso tornavam-se caóticas toda a vez que chovia. Mesmo assim, os dois perseveraram e tiveram a idéia, apoiados pelos freqüentadores, de construir estrutura para camping.

     Outro grande batalhador pela liberdade do Pinho, desde aquela época, era Elmo, artista plástico nativo da região, que costumava vir à praia com a esposa. O grupo de naturistas assíduos, a maior parte, gente que vivia nas redondezas, de Florianópolis a Joinville, continuava aumentando; a reportagem de Tarlis Batista, em oitenta e quatro, era mesmo expressão da verdade, o Pinho existia.

     Em 1985, outro nome que estará para sempre ligado à história do Naturismo no Brasil, chegou ao Pinho quase por acaso, como descreve em seu livro "Naturismo - A Redescoberta do Homem" (Editora Magister - 1a Edicão - 1993), era Celso Rossi, de Porto Alegre, fundador, e atual presidente** da FBN, que já representou o Naturismo brasileiro em dois congressos internacionais, o de 1992, na Flórida, e o de 1994, na Áustria.

     Desde cedo, os primeiros freqüentadores do Pinho aprenderam que tinham que se proteger de curiosos inconvenientes e até de opositores violentos. Atitudes fora da conduta ética naturista tinham de ser coibidas, pessoas novas que chegassem e aderissem à filosofia, tinham de ser orientadas, e a segurança da praia precisava ser mantida. Um torneiro mecânico de Balneário Camboriú, de origem alemã, Siegfried Heyder, o Zig, tornou-se logo o maior guardião da praia. Em atitude quase policialesca, apesar do modo simpático, Zig circula pela praia diariamente, até hoje, observando a conduta dos presentes e evitando problemas. Na recepção das pessoas que chegavam apenas para ver de perto, ou ainda para participar, despontou a própria Rose, Roselandi E. Moennich, a quem considero minha madrinha no Naturismo brasileiro, pelo carinho da acolhida e clareza das orientações, quando de meu telefonema.

     Na tarde do dia treze de janeiro de 1986, porém, a polícia invadiu a praia do Pinho, levando presas mais de vinte pessoas que gozavam as delícias da mesma, numa operação conjunta, sob o comando do então Secretário de Segurança Pública, Heitor Luiz Sché. Dois dias mais tarde, indignado pela atitude policial, o Jornal de Santa Catarina, de maior circulação no estado, estampava em manchete: "NUDISTAS PRESOS, ASSALTOS CONTINUAM", sobre uma matéria onde o então já ex-Secretário de Turismo de Balneário Camboriú, citado na matéria de Tarlis Batista, de dois anos antes, como grande incentivador da oficialização da praia para o Naturismo, Osmar Nunes Filho, demonstrava todo o seu repúdio ao lamentável episódio.

     Logo depois da ação policial, e da interdição oficial da praia, o que vinha inclusive destruir as aspirações e o trabalho de quase dois anos, de Álvaro e Yvonete; Rose e Edo chegaram à praia, encontrando-os inconsoláveis, com sua casa lacrada pela justiça. Sem pensar duas vezes, Rose despiu-se e foi para a praia, decidida a enfrentar quem quer que fosse. Não tardou a aparecer uma viatura da Polícia Militar, para patrulhar a área, mas ela não se intimidou diante dos policiais, que terminaram indo embora sem levá-la.

     A coragem de Rose, manteve acesa a chama da liberdade do Naturismo no Brasil. Em pouco tempo, a polícia deixaria de incomodar os naturistas, e passaria mesmo a protegê-los, como ocorre hoje, em que todos os dias uma viatura desce ao Pinho para certificar-se de que tudo esteja bem.

     No mês de fevereiro daquele mesmo ano, Celso Rossi fundou a Associação dos Amigos da Praia do Pinho, AAPP, durante uma festa de carnaval, no interior do restaurante da praia. Logo teriam um estatuto, e mais tarde um código de ética naturista, que rege até hoje o comportamento na praia.

     Em janeiro de 1988, Celso largou tudo o que tinha em Porto Alegre, emprego nas empresas da família, apartamento, amigos, e foi de mudança para o Pinho, onde acampou. Por esta época, Álvaro havia pavimentado a estradinha de acesso à praia, e construído um tosco bar na areia, sob um telhado que seu Domingos havia feito construir para garantir um pouco de sombra aos banhistas, nas horas de sol mais quente. Outro filho deste, irmão de Yvonete, o Yvan, também construíra um bar na areia, um pouco mais ao sul, bem mais sofisticado, com salão de jogos e cancha de bocha, para abrir apenas nas temporadas de verão.

     Naquele mesmo mês, Celso fundou ainda a Federação Brasileira de Naturismo, FBN, para oficializar a existência definitiva do Naturismo no Brasil e afiliar-se à INF, como nossa Luz del Fuego já fizera. No mês de agosto, foi procurado pelo Comendador Aloísio Camargo de Araújo, que desejava oferecer-lhe suas terras, no morro da Tartaruga, ao lado da praia do Pinho, imensa área de mata atlântica virgem. Patrãozinho, como é conhecido o comendador Aloísio, e seu irmão Antônio, firmaram com Celso, um acordo de comodato para o uso das terras pela FBN e AAPP.

     Por aquela época, tinha-se que praticamente escalar o costão rochoso, para chegar-se ao local, vindo da praia. Celso, Elmo, Zig e outros, decidiram construir lá estrutura para a instalação das sedes das duas agremiações; arregaçaram as mangas e foram à luta. Em poucos meses, ergueram os prédios que hoje compõem o Paraíso da Tartaruga.

     "Em fevereiro de 1988, a Voz do Brasil anunciava em cadeia nacional o reconhecimento do estatuto da Associação de Amigos da Praia do Pinho. Acabava de nascer a primeira praia oficial de nudismo do país (Extraído da reportagem Turismo Despido de Preconceitos e Roupas, de Maurício Zágari - Jornal do Brasil - quarta-feira, 19/10/94).

*Naturista gerente do bar da praia de Massarandupió na Bahia.

robertoelurdes@hotmail.com

 

** As informações contidas neste documento se referem às condições existentes na época em que foi escrito. Atualmente a sigla da Federação Brasileira de Naturismo é FBrN e a atual presidente é Maria Luzia de Almeida. A Rio Nat não existe mais.

Na próxima edição de OLHO NU leia a última e emocionante parte desta saga de Roberto Soares.

 
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