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Jornal Olho nu - edição N°234 - Maio de 2020 - Ano XX

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Duque de Richelieu nudista. Georgianos nudistas.

 

Por Arthur Virmond de Lacerda Neto

5/IV/2020

 

John Roderigo dos Passos (foto) nasceu em Chicago em 1896; morreu em Baltimore em 1970. Tinha avô português, cujo sobrenome herdou.

 

Escreveu 35 livros, dentre os quais "O Brasil em movimento" (1963) e "Os melhores tempos" (1966). Neste transmite suas memórias, em que narra anedota de um nudista, que passava por ser duque de Richelieu, o que não poderia ser, porquanto o derradeiro do título nasceu em 1875 e em 1912, por ocasião do fato, contava 37 anos e já não era rapaz, como o qualifica o autor.
Eis a anedota:

 

“Creio que foi nesse mesmo Verão de 1912, que o Comodoro [alcunha do pai do autor] levou um francês numa das suas viagens na Gaivota. Era um cliente, um rapaz bronzeado, de modos despretensiosos. O nome dele, le duc de Richelieu, despertava todos os romances de Dumas que me enchiam o cérebro. Estavam os dois metidos em qualquer empresa internacional, respeitante ao México. Nunca me teria ocorrido fazer ao Comodoro uma pergunta sobre os seus negócios, por isso só me restava deitar-me a adivinhar. De qualquer modo o duque provocou um escândalo. Verificou-se que era um dos primeiros nudistas. Pedia que o levassem para terra, e vagueava na praia de Sandy Port, nuzinho em pelo. Achava que ao sair do nosso pequeno grupo de casas e celeiros, junto da fábrica de conservas, entrava numa região virgem.

 

Desconhecia o facto de que havia uma família de Taliaferros, a viver numa casa de madeira sem pintura, ao fundo da praia. Os irmãos eram pescadores que nos forneciam o peixe diário, mas a irmã, miss Mary, era uma solteirona.

 

Miss Mary via tudo e ouvia tudo sem sair da porta da casa. Embora a família tivesse conhecido melhores dias, ela ainda possuía alguns móveis bonitos, antigos, e tinha um certo orgulho na glória do seu nome. Quando avistou o duque nu, a passear-lhe em frente das janelas, ameaçou chamar o xerife.

 

O Comodoro era muito seu amigo e gostava de parar a conversar com ela — uma figura magrizela, vestida de riscado de xadrez, com uma touca atada por baixo do queixo — quando dava os seus passeios pela estrada de árvores densas em direcção a Lynch´s Point. Ficavam a cavaquear por sobre a paliçada de paus sem tinta, que rodeava o jardinzinho dela, coberto de ervas daninhas. As conversas dos dois eram principalmente sobre as cabeças coroadas da Europa. Mas até o Comodoro teve dificuldade em convencê-la a não mandar chamar o xerife. O facto de o homem nu ser um nobre de alto grau não lhe causou a mínima impressão. A história viajou numa risada de troça contínua através de toda aquela parte do condado.” ("Os melhores tempos", Editorial Ibis, Venda Nova, Portugal, 1968, tradução de Maria da Graça Cardoso, p. 34).

 

Em 1912, o nudismo na França já existia nas camadas elevadas da sociedade: nobreza, alta burguesia, altas patentes militares.

 

Na sua passagem por Batum (na Geórgia), em 1921, observa, quanto a banhos de mar: “Nunca se ouvira falar em fatos de banho. Homens e mulheres nus formavam grupos separados. Como [John dos Passos] era um ser de hábitos formados, tive de enfiar os meus calções de banho. Pareciam estranhamente indecentes entre a multidão nua e recatada.” (Ibidem, p. 131).

 

A separação por sexos teria alguma motivação: pudor, ciúme dos maridos ou o que fosse, mas a nudez dos dois bandos atesta ausência de vergonha, pelo menos no seio de cada qual. Pudico, desafeito à nudez social, o autor encobre sua genitália e nádegas e, semi-vestido, sente-se indecente em meio aos demais, nus e recatados (em vez de nus e libertinos, como poderia supor a mentalidade pudica e maliciosa e maliciosa porque pudica). A nudez integral e social pode ser perfeitamente decorosa e isenta de sexualidade e de malícia: nisto precisamente radica a mensagem do nudismo como filosofia e modo de estar.

 

* Acompanhe artigos diversos do autor em seu blog: https://arthurlacerda.wordpress.com/  
 

(envaido em 8/04/20 por Arthur V. de Lacerda Neto))


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