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Jornal Olho nu - edição N°202 - Setembro de 2017 - Ano XVIII

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Saúde e Nudismo: Vivendo Naturalmente

1ª parte

por Paulo Pereira*

 

Sublinhando em negrito a grande importância da reflexão serena e aprofundada, sempre distante de qualquer enfoque, ainda que eventual, de caráter discricionário ou oportunista, volto a destacar com ênfase especial o papel relevante do chamado olhar perceptivo, notadamente quando queremos propor a consideração atenta do desnudamento integral, corpo e mente, como condição ideal ou referência rica, e básica, para que se possa efetivamente conhecer e praticar adequadamente o modo de vida nudista-naturista, abandonando energicamente todos os casuísmos, os persistentes e ocos modismos, as superficialidades cômodas e as demonstrações melancólicas de pseudo-erudição.

 

Convido, desde já, para uma breve consulta a respeito do real significado de teoria e prática, conceitos que se mostram fundamentais e que frequentemente são confundidos e até mesmo distorcidos, o que dificulta o bom entendimento da questão. E, de passagem, anotemos que a primeira dificuldade a ser tratada é a proclamada preguiça intelectual, a preguiça de ler e estudar, de buscar as fontes idôneas e datadas. Falta atitude...

 

O consagrado biólogo evolucionista Richard Dawkins chama de “arrogância a posteriori” a leitura descabida e frágil feita pelos especialistas em generalidades, pelos profetas do passado conhecido, que tentam, insones, reescrever a História, substituindo fatos por meras versões ou, pior, por palpites subjetivos. Anotemos, uma vez mais, que a história do Nudismo Social Moderno, do Movimento Nudista-Naturista, da nudez codificada, é de domínio e conhecimento públicos e notórios, desde Richard Ungewitter, no início do século XX, na Alemanha. As colocações afoitas, estimuladas pelo radicalismo político-ideológico, em geral, não passam de disparates de pós-verdade, de desconstruções sem qualquer respaldo sério. Lembremos sempre que os termos “nudismo” e “naturismo” não são opostos, discrepantes nem mesmo diversos na prática, estando ambos, atualmente, consagrados pelo uso comum, registrados nos dicionários de forma clara, inclusive como ressaltamos pormenorizadamente no ensaio intitulado “Da Identidade Nua”, 2015, publicado pelo site do Jornal Olho Nu, na Internet. (disponível para download em http://www.jornalolhonu.com/jornais/olhonu_n_178/Da_identidade_Nua.pdf)

 

A ciência, incluindo-se concretamente a História, não prestigia dogmas ou mitos, mas procura a verdade dos fatos, pesquisando continuamente os dados objetivos, as provas e contraprovas, teorias e práticas, afinal, antes de proclamar resultados definitivos, até porque as certezas imutáveis são vistas com reserva pelo conhecimento científico. Sem teoria, sem teóricos, não há ciência, não há saber sólido, e a boa prática perde referência. Não devemos construir edifícios começando pelos telhados...

 

Dessa forma, observemos que os dicionários definem “teoria” como “conjunto de regras sistematizadas que fundamentam uma ciência ou conhecimento especulativo sobre determinado assunto”, e definem “prática” como “ação, execução, exercício”... A prática é o uso, o exercício do conhecimento sistematizado, cumprindo, pois, conhecer bem as regras e fundamentos sistematizados para, então, iniciar a ação, a prática. E certamente não será negando os fatos, a história, os pioneiros, os fundamentos, as regras sistematizadas, que iremos obter um exercício adequado, bem concebido, uma prática correta e saudável. É indispensável dar atenção inteira à verdade de que não devemos reduzir todo conhecimento efetivo ao simples e ocasional empirismo. Ninguém, por outro lado, nega diretamente o valor conhecido do conhecimento e do aprendizado empíricos, práticos, mas o real saber exige referência sólida, fundamento comprovado, estudo aprofundado, reflexão, raciocínio, respaldo acadêmico. Improviso sistemático e casuísmo não são base sólida para nenhuma construção durável. Registremos, de passagem, que “ser um teórico”, um teórico afirmado, um conhecedor estudioso, não desqualifica ninguém de forma irônica e ignorante; pelo contrário, lembremos enfaticamente que não há sabedoria sem conhecimento, sem teórica, sem tese inteligente, sem estudo, afobadamente... Registremos também, por exemplo, os feitos de dois ícones, de dois teóricos qualificados, como Sir Charles Darwin (“A Origem das Espécies Através da Seleção Natural”) e Albert Einstein (Teoria Geral da Relatividade), teorias que jamais foram contestadas... O que inquieta, e até assusta, é a repetida atuação de falsos teóricos, de oportunistas inconsequentes, que desprezam o conhecimento e vivem elucubrando tolices e desconstruções, fato lamentável, que infelizmente ocorre nos vários campos da atividade humana, especialmente nesses tempos de superficialidades, de mediocridade festejada.

 

Isto posto, façamos uma releitura breve, mas atenta, de um excelente artigo da consagrada revista inglesa, pioneira, “H-E-Health and Efficiency”, 1953, numa tradução especial, feita para a famosa revista “Saúde e Nudismo”, do Rio de Janeiro, pelo grande amigo e ilustre pioneiro Daniel de Brito. A matéria tem um título muito sugestivo: “O que é Naturismo”... Exatamente no já referido contexto do conceito e práxis, o exame cuidadoso do texto nos faz perceber que se trata, antes de tudo, de uma página de prosa poética, naturalista, idealista, que ressalta a beleza e a liberdade prazerosa do natural, da mãe natureza toda pura. O artigo faz de pronto a grande pergunta, que o tempo tornou, de certa forma, recorrente, inconclusiva: “O que queremos dizer exatamente por Naturismo?”... O foco é claro, poético, repetimos, valorizando, sobretudo, o contato direto com o ambiente que nos cerca, buscando a libertação das rotinas sociais. São colocados exemplos e situações, ou sensações, relativos ao stress da vida agitada, tendo, por contraponto, a convivência com a natureza, inclusive sem vestes. É dado destaque ao papel positivo das reuniões entre amigos de mesmo ideal, nos fins de semana e nos feriados, longe dos artificialismos da sociedade majoritária. Citemos, então, um parágrafo revelador: “Tudo isso é mais que naturismo: é vida. É somente dessa maneira que se pode realmente viver, e viver bem e frutuosamente... Onde não há clubes não há Movimento. É como no “paraíso”, onde não era bom que o homem ficasse sozinho. Revelamos colher os ricos benefícios do Nudismo Social, se é que queremos crescer em força e progresso. Esse é o Naturismo. De um lado, a íntima comunhão com a natureza experimentada na solidão, e os benefícios sociais e culturais da vida nos clubes, onde todos os assuntos e problemas são discutidos com simpatia e compreensão”... As palavras colocadas são de fácil análise e constituem referência de caráter histórico. Realmente vale salientar, como o artigo propõe, que é fundamental a íntima relação com a natureza, inclusive através do nudismo social, o que definitivamente implica a procura do despojamento psico-físico, da simplicidade consciente, da tolerância, da ausência de preconceitos, de julgamentos odiosos, sobretudo. Por acréscimo, no caso específico do Movimento Nudista-Naturista, implica no estudo de fundamento e práxis, torna-se essencial a referência histórico-filosófica já secular, evitando-se, por exemplo, possíveis confusões entre nudismo-naturismo e naturalismo, senso estrito.

 

A revista “Saúde e Nudismo”, um ícone histórico-jornalístico, exerceu um papel relevante na construção do nosso Nudismo-Naturismo Brasileiro, oferecendo boa leitura diversificada e trabalhando, de fato, firmemente pelo progresso e pelo conhecimento e prática do modo de vida natural entre nós, numa época conservadora e pudica, mais rica de novas iniciativas no mundo pós-guerra. No Brasil, em 1950, havia sido publicado o primeiro livro nudista-naturista, chamado “A Verdade Nua”, de Luz del Fuego, inclusive com a criação, em 1954, do Clube do Sol (Ilha do Sol), no Rio de Janeiro, também por Luz del Fuego, primeiro clube nudista-naturista do país, logo após a criação, em 1953, na França, da INF – International Naturist Federation, anotemos novamente. E o enfoque mais voltado para as bases naturalistas do referido artigo (O que é Naturismo), por exemplo, constitui uma marca, um modismo da época, com a valorização do natural e da paz. O termo “naturismo”, sublinhemos, ainda não tinha seu uso consagrado, unido ao termo “nudismo”, como atestam ricamente os mais importantes dicionários, inclusive de inglês e português, das décadas de 1940, 1950 e 1960. Antes disso, os médicos franceses André e Gaston Durville já haviam criado a revista “La Vie Sage” (A Vida Sadia), em 1926, que preconizava valores naturalistas e terapias nudistas... E foram precisamente esses irmãos Durville, médicos naturalistas, que lançaram o termo “naturismo”(naturisme), visando uma filosofia e prática voltadas para o natural, inclusive organizando atividades na famosa “Ile Platais”, ilha destinada a essa então nova prática alternativa, que buscava integrar homem e natureza, fato registrado por vários autores afirmados, como o francês Jean Deste (“Le Nudisme”, 1961). Isso é História! É importante ressaltar.
 

Atualmente, os dicionários da língua portuguesa anotam oficialmente os termos “nudismo”, “nudista”, “naturismo” e “naturista” de forma clara. Por exemplo: “Nudismo – doutrina que prega o vier ao ar livre em completa nudez”; e “Naturismo – valorização dos agentes da natureza como meios terapêuticos; filosofia de vida que recomenda um maior contato com a natureza, vida ao ar livre, alimentos naturais e nudismo”... É essencial, e racional, anotarmos, desde já, essas definições, afinal, sem subjetividades ou meras preferências, e sem confusão com “Naturalismo”, que é o Movimento artístico e literário do século XIX, que, influenciado pelos princípios e métodos das ciências naturais, procura retratar a realidade com objetividade, sem idealização... E Nudismo-Naturismo também não é ideologia, mas apenas modo ou filosofia de vida, naturalmente!

 

Precisamos fazer a grande reflexão, que inclusive o artigo comentado de “Saúde e Nudismo” nos oferece, especialmente quando ainda persistem distorções e desconstruções cansativas e pouco inteligentes, que tentam ignorar a verdade nua do Movimento.

 

O artigo em pauta, original de “Health and Efficiency”, 1953, salienta valores naturais, nudez social (Nudismo Social Moderno) e um grande despojamento psico-físico, o que merece nossa atenção. É bom recordar sempre que a natureza não veste rigorosamente ninguém... O que o artigo sugere mais fundamente é a busca pela natureza sem véus, com a adoção de um modo de vida sem radicalismos, sem falsos pudores, com humildade serena e consciente, com o culto do silêncio nobre, com a prática de exercícios ao ar livre, de preferência em estado de completa nudez. É mister repensar o pudor, as hipocrisias, os medos, os apegos e as violências. Seria bom que todos aprendessem, modestamente, a ouvir as vozes do silêncio, dos ventos livres, dos sons sutis, que emanam das águas e das matas, sem falsa erudição, sem confundir ou menosprezar teoria e prática, sempre naturalmente!

 

Em tempo: A releitura de textos datados, autênticos, como o da revista “Saúde e Nudismo”, 1953, é sempre muito enriquecedora. Especialmente quando uma minoria desinformada pretende negar o termo “nudismo” e sua rica essência histórico-filosófica, sem tentar serenamente perceber sua inclusão, como doutrina consagrada, e sua integração histórica com o “naturismo”, cuja origem real poucos conhecem bem, certamente o que se está fazendo é inventar algo exótico (naturismo sem nudismo), algo sem nome, sem respaldo, sem isenção, talvez uma colocação pudica e descabida, uma pós-verdade natimorta... É, pois, tempo de somar, de crescer, de viver. E para crescer efetivamente, é indispensável entender que a vida é um processo assimétrico e evolutivo, que ignora mitos, privilégios e pudores pueris. A verdade natural é nua e crua! Não há concretamente nenhum desafio teórico válido, pertinente, que nos leve a imaginar redefinições afoitas de conceito e de forma, no vasto campo do papel da ciência histórica, e certamente no que diz respeito ao Movimento Nudista-Naturista. Devemos cultivar a reflexão séria, o estudo, sempre exercendo a tolerância, a magnanimidade, e, sobretudo, a simplicidade, a naturalidade, conforme a natureza!...
 

 

(enviado em 8/08/17 por Paulo Pereira)


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