Saúde e Nudismo: Vivendo Naturalmente
Sublinhando em negrito a grande importância da reflexão serena e
aprofundada, sempre distante de qualquer enfoque, ainda que
eventual, de caráter discricionário ou oportunista, volto a destacar
com ênfase especial o papel relevante do chamado olhar perceptivo,
notadamente quando queremos propor a consideração atenta do
desnudamento integral, corpo e mente, como condição ideal ou
referência rica, e básica, para que se possa efetivamente conhecer e
praticar adequadamente o modo de vida nudista-naturista, abandonando
energicamente todos os casuísmos, os persistentes e ocos modismos,
as superficialidades cômodas e as demonstrações melancólicas de
pseudo-erudição.
Convido, desde já, para uma breve consulta a respeito do real
significado de teoria e prática, conceitos que se mostram
fundamentais e que frequentemente são confundidos e até mesmo
distorcidos, o que dificulta o bom entendimento da questão. E, de
passagem, anotemos que a primeira dificuldade a ser tratada é a
proclamada preguiça intelectual, a preguiça de ler e estudar, de
buscar as fontes idôneas e datadas. Falta atitude...
O consagrado biólogo evolucionista Richard Dawkins chama de
“arrogância a posteriori” a leitura descabida e frágil feita pelos
especialistas em generalidades, pelos profetas do passado conhecido,
que tentam, insones, reescrever a História, substituindo fatos por
meras versões ou, pior, por palpites subjetivos. Anotemos, uma vez
mais, que a história do Nudismo Social Moderno, do Movimento
Nudista- Naturista, da nudez codificada, é de domínio e conhecimento
públicos e notórios, desde Richard Ungewitter, no início do século
XX, na Alemanha. As colocações afoitas, estimuladas pelo radicalismo
político-ideológico, em geral, não passam de disparates de
pós-verdade, de desconstruções sem qualquer respaldo sério.
Lembremos sempre que os termos “nudismo” e “naturismo” não são
opostos, discrepantes nem mesmo diversos na prática, estando ambos,
atualmente, consagrados pelo uso comum, registrados nos dicionários
de forma clara, inclusive como ressaltamos pormenorizadamente no
ensaio intitulado “Da Identidade Nua”, 2015, publicado pelo site do
Jornal Olho Nu, na Internet. (disponível para download em
http://www.jornalolhonu.com/jornais/olhonu_n_178/Da_identidade_Nua.pdf)
A ciência, incluindo-se concretamente a História, não prestigia
dogmas ou mitos, mas procura a verdade dos fatos, pesquisando
continuamente os dados objetivos, as provas e contraprovas, teorias
e práticas, afinal, antes de proclamar resultados definitivos, até
porque as certezas imutáveis são vistas com reserva pelo
conhecimento científico. Sem teoria, sem teóricos, não há ciência,
não há saber sólido, e a boa prática perde referência. Não devemos
construir edifícios começando pelos telhados...
Dessa forma, observemos que os dicionários definem “teoria” como
“conjunto de regras sistematizadas que fundamentam uma ciência ou
conhecimento especulativo sobre determinado assunto”, e definem
“prática” como “ação, execução, exercício”... A prática é o uso, o
exercício do conhecimento sistematizado, cumprindo, pois, conhecer
bem as regras e fundamentos sistematizados para, então, iniciar a
ação, a prática. E certamente não será negando os fatos, a história,
os pioneiros, os fundamentos, as regras sistematizadas, que iremos
obter um exercício adequado, bem concebido, uma prática correta e
saudável. É indispensável dar atenção inteira à verdade de que não
devemos reduzir todo conhecimento efetivo ao simples e ocasional
empirismo. Ninguém, por outro lado, nega diretamente o valor
conhecido do conhecimento e do aprendizado empíricos, práticos, mas
o real saber exige referência sólida, fundamento comprovado, estudo
aprofundado, reflexão, raciocínio, respaldo acadêmico. Improviso
sistemático e casuísmo não são base sólida para nenhuma construção
durável. Registremos, de passagem, que “ser um teórico”, um teórico
afirmado, um conhecedor estudioso, não desqualifica ninguém de forma
irônica e ignorante; pelo contrário, lembremos enfaticamente que não
há sabedoria sem conhecimento, sem teórica, sem tese inteligente,
sem estudo, afobadamente... Registremos também, por exemplo, os
feitos de dois ícones, de dois teóricos qualificados, como Sir
Charles Darwin (“A Origem das Espécies Através da Seleção Natural”)
e Albert Einstein (Teoria Geral da Relatividade), teorias que jamais
foram contestadas... O que inquieta, e até assusta, é a repetida
atuação de falsos teóricos, de oportunistas inconsequentes, que
desprezam o conhecimento e vivem elucubrando tolices e
desconstruções, fato lamentável, que infelizmente ocorre nos vários
campos da atividade humana, especialmente nesses tempos de
superficialidades, de mediocridade festejada.
Isto posto, façamos uma releitura breve, mas atenta, de um excelente
artigo da consagrada revista inglesa, pioneira, “H-E-Health and
Efficiency”, 1953, numa tradução especial, feita para a famosa
revista “Saúde e Nudismo”, do Rio de Janeiro, pelo grande amigo e
ilustre pioneiro Daniel de Brito. A matéria tem um título muito
sugestivo: “O que é Naturismo”... Exatamente no já referido contexto
do conceito e práxis, o exame cuidadoso do texto nos faz perceber
que se trata, antes de tudo, de uma página de prosa poética,
naturalista, idealista, que ressalta a beleza e a liberdade
prazerosa do natural, da mãe natureza toda pura. O artigo faz de
pronto a grande pergunta, que o tempo tornou, de certa forma,
recorrente, inconclusiva: “O que queremos dizer exatamente por
Naturismo?”... O foco é claro, poético, repetimos, valorizando,
sobretudo, o contato direto com o ambiente que nos cerca, buscando a
libertação das rotinas sociais. São colocados exemplos e situações,
ou sensações, relativos ao stress da vida agitada, tendo, por
contraponto, a convivência com a natureza, inclusive sem vestes. É
dado destaque ao papel positivo das reuniões entre amigos de mesmo
ideal, nos fins de semana e nos feriados, longe dos artificialismos
da sociedade majoritária. Citemos, então, um parágrafo revelador:
“Tudo isso é mais que naturismo: é vida. É somente dessa maneira que
se pode realmente viver, e viver bem e frutuosamente... Onde não há
clubes não há Movimento. É como no “paraíso”, onde não era bom que o
homem ficasse sozinho. Revelamos colher os ricos benefícios do
Nudismo Social, se é que queremos crescer em força e progresso. Esse
é o Naturismo. De um lado, a íntima comunhão com a natureza
experimentada na solidão, e os benefícios sociais e culturais da
vida nos clubes, onde todos os assuntos e problemas são discutidos
com simpatia e compreensão”... As palavras colocadas são de fácil
análise e constituem referência de caráter histórico. Realmente vale
salientar, como o artigo propõe, que é fundamental a íntima relação
com a natureza, inclusive através do nudismo social, o que
definitivamente implica a procura do despojamento psico-físico, da
simplicidade consciente, da tolerância, da ausência de preconceitos,
de julgamentos odiosos, sobretudo. Por acréscimo, no caso específico
do Movimento Nudista-Naturista, implica no estudo de fundamento e
práxis, torna-se essencial a referência histórico-filosófica já
secular, evitando-se, por exemplo, possíveis confusões entre
nudismo-naturismo e naturalismo, senso estrito.
A revista “Saúde e Nudismo”, um ícone histórico-jornalístico,
exerceu um papel relevante na construção do nosso Nudismo-Naturismo
Brasileiro, oferecendo boa leitura diversificada e trabalhando, de
fato, firmemente pelo progresso e pelo conhecimento e prática do
modo de vida natural entre nós, numa época conservadora e pudica,
mais rica de novas iniciativas no mundo pós-guerra. No Brasil, em
1950, havia sido publicado o primeiro livro nudista-naturista,
chamado “A Verdade Nua”, de Luz del Fuego, inclusive com a criação,
em 1954, do Clube do Sol (Ilha do Sol), no Rio de Janeiro, também
por Luz del Fuego, primeiro clube nudista-naturista do país, logo
após a criação, em 1953, na França, da INF – International Naturist
Federation, anotemos novamente. E o enfoque mais voltado para as
bases naturalistas do referido artigo (O que é Naturismo), por
exemplo, constitui uma marca, um modismo da época, com a valorização
do natural e da paz. O termo “naturismo”, sublinhemos, ainda não
tinha seu uso consagrado, unido ao termo “nudismo”, como atestam
ricamente os mais importantes dicionários, inclusive de inglês e
português, das décadas de 1940, 1950 e 1960. Antes disso, os médicos
franceses André e Gaston Durville já haviam criado a revista “La Vie
Sage” (A Vida Sadia), em 1926, que preconizava valores naturalistas
e terapias nudistas... E foram precisamente esses irmãos Durville,
médicos naturalistas, que lançaram o termo “naturismo”(naturisme),
visando uma filosofia e prática voltadas para o natural, inclusive
organizando atividades na famosa “Ile Platais”, ilha destinada a
essa então nova prática alternativa, que buscava integrar homem e
natureza, fato registrado por vários autores afirmados, como o
francês Jean Deste (“Le Nudisme”, 1961). Isso é História! É
importante ressaltar.
Atualmente, os dicionários da língua portuguesa anotam oficialmente
os termos “nudismo”, “nudista”, “naturismo” e “naturista” de forma
clara. Por exemplo: “Nudismo – doutrina que prega o vier ao ar livre
em completa nudez”; e “Naturismo – valorização dos agentes da
natureza como meios terapêuticos; filosofia de vida que recomenda um
maior contato com a natureza, vida ao ar livre, alimentos naturais e
nudismo”... É essencial, e racional, anotarmos, desde já, essas
definições, afinal, sem subjetividades ou meras preferências, e sem
confusão com “Naturalismo”, que é o Movimento artístico e literário
do século XIX, que, influenciado pelos princípios e métodos das
ciências naturais, procura retratar a realidade com objetividade,
sem idealização... E Nudismo-Naturismo também não é ideologia, mas
apenas modo ou filosofia de vida, naturalmente!
Precisamos fazer a grande reflexão, que inclusive o artigo comentado
de “Saúde e Nudismo” nos oferece, especialmente quando ainda
persistem distorções e desconstruções cansativas e pouco
inteligentes, que tentam ignorar a verdade nua do Movimento.
O artigo em pauta, original de “Health and Efficiency”, 1953,
salienta valores naturais, nudez social (Nudismo Social Moderno) e
um grande despojamento psico-físico, o que merece nossa atenção. É
bom recordar sempre que a natureza não veste rigorosamente
ninguém... O que o artigo sugere mais fundamente é a busca pela
natureza sem véus, com a adoção de um modo de vida sem radicalismos,
sem falsos pudores, com humildade serena e consciente, com o culto
do silêncio nobre, com a prática de exercícios ao ar livre, de
preferência em estado de completa nudez. É mister repensar o pudor,
as hipocrisias, os medos, os apegos e as violências. Seria bom que
todos aprendessem, modestamente, a ouvir as vozes do silêncio, dos
ventos livres, dos sons sutis, que emanam das águas e das matas, sem
falsa erudição, sem confundir ou menosprezar teoria e prática,
sempre naturalmente!
Em tempo: A releitura de textos datados, autênticos, como o da
revista “Saúde e Nudismo”, 1953, é sempre muito enriquecedora.
Especialmente quando uma minoria desinformada pretende negar o termo
“nudismo” e sua rica essência histórico-filosófica, sem tentar
serenamente perceber sua inclusão, como doutrina consagrada, e sua
integração histórica com o “naturismo”, cuja origem real poucos
conhecem bem, certamente o que se está fazendo é inventar algo
exótico (naturismo sem nudismo), algo sem nome, sem respaldo, sem
isenção, talvez uma colocação pudica e descabida, uma pós-verdade
natimorta... É, pois, tempo de somar, de crescer, de viver. E para
crescer efetivamente, é indispensável entender que a vida é um
processo assimétrico e evolutivo, que ignora mitos, privilégios e
pudores pueris. A verdade natural é nua e crua! Não há concretamente
nenhum desafio teórico válido, pertinente, que nos leve a imaginar
redefinições afoitas de conceito e de forma, no vasto campo do papel
da ciência histórica, e certamente no que diz respeito ao Movimento
Nudista-Naturista. Devemos cultivar a reflexão séria, o estudo,
sempre exercendo a tolerância, a magnanimidade, e, sobretudo, a
simplicidade, a naturalidade, conforme a natureza!...
(enviado em 8/08/17
por Paulo Pereira)
|
|