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Jornal Olho nu - edição N°176 - Julho de 2015 - Ano XV

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Teologia da nudez, por um nudista.

(segunda parte)

 

por Arthur Virmond de Lacerda Neto*

6.XII.2014

 

Leia a primeira parte clicando aqui

 

O pecado original foi de desobediência.

 

 

Dos frutos das árvores do Paraíso, deus permitiu que Adão e Eva comessem todos, salvo o da árvore da ciência do bem e do mal. Havia uma permissão com exceção ou, por outra, o consentimento de ambos alimentarem-se dos frutos das árvores em geral, e a proibição de fazerem-no em relação a determinada árvore.

 

Eis que ambos servem-se do fruto dela, ou seja, desobedecem à deidade: praticaram o proibido, cônscios da proibição e da infração. Na desobediência consistiu o pecado original.

 

Após provarem o fruto proibido, conheceram a sua nudez; conhecendo-a, ocultaram-se para não serem vistos nus por deus e com folhas de figueira fizeram tapa-sexos.

 

Se o pecado não se relacionava com a sexualidade, por que, então as folhas encobriam a genitália, região, no homem e na mulher, destinada ao congresso sexual?

 

Não houve motivo identificável na escolha da genitália. Ela foi aleatória. Eles encobriram-na como símbolo da sua vergonha e do seu arrependimento pela sua desobediência e não por vergonha da genitália em si nem do erotismo.

 

Adão e Eva apuseram as folhas de figueira como exteriorização, perante deus, da perturbação que lhes suscitara haverem-lhe infringido a proibição e não por pejo de que ele lhes visse o pênis ou a vulva, ou seja, por pudor.

 

Encobriram a genitália como poderiam haver encoberto qualquer outra parte do corpo, total ou parcialmente: a cabeça, as mãos, os dedos, um dedo, mais de um dedo; as orelhas ou uma delas; o pescoço ou parte dele; o abdômen, o umbigo; os joelhos ou um deles; as pernas ou uma delas; os pés ou um deles; as nádegas; as costas, ou algumas destas partes, combinadamente. Velariam a parte eleita por meio de chapéu, solidéu, colar, pulseira, bracelete, anel, brinco, luvas, meias ou qualquer outro artifício.

 

Se assim fora, as populações cristãs teriam passado os últimos mil e setecentos anos envergonhados da orelha, da cabeça, da mão, do dedo, do joelho, do umbigo, do pescoço, do pé, da nádega ou de qualquer outra região corporal.

 

Porque o símbolo do arrependimento localizou-se na genitália, na mentalidade cristã incorporou-se a vergonha dela e a identificação de moralidade com o seu ocultamento, sem que, em si e intrinsecamente, a exposição das partes que eles ocultaram fosse vergonhosa; sem que, em si e intrinsecamente, o velamento delas fosse meritório.

 

Nem vergonhosa nem meritório, apenas simbólico. Logo, em si e intrinsecamente, a genitália é inocente.

 

Erótico ou de desobediência, o pecado, cometido pelos patriarcas, neles se esgotou: Adão e Eva foram os seus agentes e como tal sofreram a punição da expulsão do Paraíso. Deus aplicou a justiça retributiva, tão justamente aplicada pelos homens: pune-se o autor do crime e ninguém mais além dele. O pecado havendo sido cometido por aquele casal, sobre ele recaiu o castigo, que não se transmitiu a ninguém mais, vale dizer, a nenhum dos seus descendentes, seja como objetos de novas punições.

 

Na sua justiça plena, jamais deus teria tornado hereditária a culpa dos patriarcas da Humanidade: a descendência de Adão e Eva não cometeu o pecado original, logo não pode ser punida por ele. Se Adão e Eva encobriram as suas genitálias como símbolo do seu vexame, não faz sentido que tal símbolo se transmitisse a quem não sofreu o vexame porque não cometeu o pecado original.

 

Adão e Eva havendo sido expulsos do Paraíso, os seus descendentes deveriam haver sido nele instalados, o que, todavia, criaria dificuldades práticas porquanto, nascidos Caim e Abel, necessitavam de Eva para amamentá-los e dos seus pais para criá-los. Ou deus repunha a estes no Paraíso, em razão da inocência dos seus filhos, ou mantinha os quatro lá para onde expulsou aqueles: prevaleceu a segunda decisão, pela qual nenhum humano voltou a residir no Paraíso.

 

Inexiste responsabilidade hereditária na Bíblia, pela qual Adão e Eva, havendo formado tapa-sexos com folhas de figueira, eles devessem ser usados pelos seus descendentes. Encobrir a genitália não constituía obrigação para a sua posteridade.

 

Ao contrário, Ezequiel nega expressamente, em nome de deus, a transmissão genealógica das culpas, ausente na pregação de Cristo e que Agostinho de Hipona introduziu no cristianismo, ao adotá-la de Platão, por sua vez, pré-cristão e, portanto, não cristão. Assim, uma doutrina ateia (em relação ao deus cristão) ingressou no cristianismo, desnaturou-o e transformou-se em fonte de mentalidade e costumes dos cristãos.

 

É inaceitável uma doutrina alheia às fontes do cristianismo determinar-lhe dogmas e usos: dogmas e usos espúrios.

 

Cometido pelos patriarcas da humanidade, o pecado original produziu efeitos que se limitaram a eles (a expulsão do Paraíso, a vergonha da desobediência, a tanga de folhas como símbolo da vergonha) e outros, que se estenderam à sua posteridade e a Cristo (que morreu devido a ele), porém nenhum sinal visível se transmitiu a esta, como memória daquele, pelo que a vestimenta encobridora da genitália não pode ser admitida como efeito do pecado original.

 

Nenhum cristão deve sentir-se na necessidade de ocultar a sua genitália, de envergonhar-se dela, de reputar indecentes o falo, o escroto, as mamas, por conta do pecado de Adão e Eva. Nenhuma justificativa existe nas escrituras sagradas em favor do pudor e da pudibundaria, que não resultam de nenhuma verdade revelada nem de nenhuma sua interpretação lídima.

 

Apesar disto, inveterou-se, nos costumes ocidentais, o encobrimento do corpo e a vergonha da sua exposição, ao menos da genitália e das mamas; em muitos países, a exposição do corpo constituía crime ou ainda o constitui: são desdobramentos errados de hermenêutica falsa.

 

Com o transcorrer dos tempos e com a secularização das sociedades, decaiu do ethos da gente esclarecida a origem lendária do pudor, embora, no Brasil e na América Latina, ele se mantenha por espírito de rotina, de imitação, em face da transmissão acrítica de certos valores e de certos comportamentos, que é altura, de há muito, de abandonar inteiramente, à exemplo do que se pratica, há mais de um século, na generalidade da Europa e, entre nós, nas infelizmente raras praias de nudismo, abundantes lá.

 

"A moral sexual laica não suprimiu o preconceito do pecado original, ao contrário: pôr-se nu em companhia dos seus semelhantes, no século 20 é, parece, ato de imoralidade incontestável, ato que não pode senão engendrar desgosto e desprezo mais profundos. Assim, o corpo e os órgãos da reprodução foram condenados a viver ocultados por motivos que não podem compreender os livre-culturistas acostumados a contemplá-los livremente, em plena luz", observava Marcelo Kienné de Mongeot, que percebeu a persistência dos atavismos axiológico e de costumes em relação ao pudor, mesmo em populações cujos valores libertaram-se das origens bíblicas dos seus costumes: esqueceram-se destas, porém mantiveram o sentimento da vergonha do corpo e os costumes de encobrir a genitália e as mamas (com os consectários legais da sua exposição em público), triste sinal da persistência, por mimese, de irracionalidades e de arcaísmos, ainda presentes no Brasil, em que as várias seitas protestantes avivam-nas dentre a gente mais intelectual e culturalmente tosca e, de conseqüência, crédula, impressionável e vulnerável à persuasão dos pastores.

 

Pecado é o da recusa da obra divina.

 

Deus criou o homem à sua imagem e semelhança: no seu corpo, Adão reproduzia-lhe as formas, ou seja, deus é antropocêntrico, dotado de idênticas características anatômicas e, portanto, de pênis, escroto, pentenhos, ereção e capaz de ato sexual.

 

Deus criou as partes sexuais no homem e na mulher, a cujo respeito disse, excelentemente, Clemente de Alexandria: Não devemos, jamais, nos envergonhar do que Deus não teve vergonha de criar .

 

De fato, ele criou tais partes; ele e não o demônio. Trata-se de partes que, como as mais dos corpos masculino e feminino, são obra divina, produto da vontade, do entendimento e da ação divinas, condição na qual não faz sentido a criatura pejar-se delas.

 

Fossem elas produtos diabólicos, houvessem elas sido inseridas por ação do demônio, para deslustrar a obra divina, afeá-la, desfigurá-la, seria compreensível que os humanos se pejassem de tê-las e de descobri-las. Porém não é assim. Ao contrário: por que a vergonha do que deus criou ?

 

Pecado de ofensa a deus é o homem ocultar, envergonhadamente, o que deus criou, como se parte da sua obra fosse vergonhosa.

 

Pecado de orgulho é o homem reputar vexatório o que deus criou, ou seja, na sua pequeneza, na sua insignificância de ente falível e defeituoso, julgar a obra maravilhosa da criação e a sapiência infinita do criador perfeito e infalível.

 

Aceitar, sem pejo, a obra do criador, na sua totalidade, o que inclui o corpo na sua inteireza, é louvar a deus e ser criatura digna da bondade infinita e da sapiência infindável de deus.

 

Se o diabo houvesse criado o pênis e a vagina e incutido nos homens e nas mulheres a libido para suscitar-lhes alguma gratidão ou simpatia por si e, conseqüentemente, desviá-los, em parte, ao menos, do amor de deus, então, genitália e sexualidade, obras diabólicas, mereceriam repúdio e ocultamento. O homem envergonhar-se-ia dos órgãos da tentação, da presença constante dos instrumentos com que o maligno pretenderia subtrair, em alguma medida, o homem do louvor que deve a deus.

 

Porém não é assim. Ao contrário: pênis e vagina, escroto e vulva, mamas, são orgãos normais, necessários, úteis, instituídos por deus para o exercício das funções normais do corpo e, sobretudo, para o cumprimento da sua ordem de multiplicar-se. Na sua sapiência, deus criou obra perfeita e emitiu mandamento exeqüível: dada a ordem de procriação, dotou os humanos dos instrumentos com que cumpri-la.

 

Na genitália acham-se os meios que deus criou para o homem poder obedecer-lhe. Tais meios são e só podem ser bem-vindos e benditos, jamais vergonhosos.

 

Se deus não sentiu vergonha de criar a genitália; se, ao contrário, dela dotou os homens para a sua utilidade e para a realização do mandamento de procriação; se o homem é teomórfico , então, nenhum humano deve envergonhar-se de expô-la.

 

Ao contrário: expô-lo equivale a patentear as formas do próprio deus, a revelar a outrem a obra divina, sem exceções. Por isto a nudez homenageia o criador; desnudar-se constitui forma de louvá-lo; os cristãos nudistas verdadeiramente amam a deus e louvam-no, na sua nudação; o nudismo doméstico, a sós e em família, o nudismo em praias e em campos corresponde a verdadeiro culto público, em que patenteamos a obra divina aos olhos próprios e alheios, ao passo que a vestimenta oculta-a, nega-a, sobrepõe à criação de deus a invenção dos homens. Pior: envergonhar-se do corpo, especialmente de certas das suas regiões, de que outrem as veja, de que nos vejam nus; encobri-las como sendo o correto e o moral, são e só podem ser insídias com que o demônio nos confunde e nos perverte, por convencer-nos de que certo é ocultar a obra do criador e errado é expô-la, de que certo é envergonharmo-nos dela e errado é não o fazermos. Satanás persuade-nos de que o certo é errado e vice-versa; por isso é mau cristão, é cristão em erro o que recusa a nudez; é bom cristão, é cristão livre do Demônio o que se desnuda sem pejo.

 

Isaías, Miquéias e Saul nus.

 

Deus ordenou a Isaías que se despisse e despido e descalço ele andou por três anos, como sinal e advertência contra o Egito e a Etiópia. Para vergonha do Egito, o rei da Assíria levará nus e descalços os prisioneiros egípcios e os exilados etíopes, jovens e velhos, com as suas nádegas expostas (Isaías, 20, 2-3).

 

A nudez de Isaías foi ordenada por deus, como forma de advertir dois países; a nudez dos prisioneiros egípcios e os exilados etíopes foi forma de humilhá-los. Há, portanto, em Isaías, duas formas de nudez, a desejada por deus e a praticada pelos homens; pela primeira, ela serviu como símbolo de advertência, ao passo que pela segunda, funcionou como vilipêndio. A primeira, instrumento do Senhor, a segunda, dos homens.

 

Como instrumento do Senhor, a nudez não foi vergonhosa, senão honrosa, pois serviu aos desígnios dele; como instrumento dos homens, foi humilhante porque aplicada a prisioneiros e a exilados como expressão de humilhação.

 

A nudez imposta pelo vencedor ao submetido exprimiu tripúdio; a outra, ordenada pelo Senhor, exprimiu a sapiência divina.

 

Logo, a nudez não é intrinsecamente vergonhosa; ao contrário, pode ser excelsa. Dependerá das circunstâncias o seu valor positivo ou negativo.

 

Miquéias (Miquéias 1,8) profetizou, nu e descalço, a ação vingadora de deus. O mensageiro divino divulgou as intenções de Jeová inteiramente despido.

 

No exercício da excelsa missão de atuar como porta-voz da própria divindade, ele julgou apropriado fazê-lo despido, ao invés de vestido. Longe de impróprio ou vergonhoso, o estado de nudez era digno da sua missão, tal como no caso de Isaías.

 

Dois profetas veiculam os propósitos do senhor, em desnudamento integral, com que se apresentam perante as gentes. Nus, exerceram a sua sublime missão; logo, a nudez não lhes era, não lhes poderia ser infamante nem censurável.

 

O rei Saul desnudou-se, de todo, e nu profetizou perante Samuel e assim conservou-se ao longo de todo o dia e a noite respectivos, motivo porque perguntaram se também ele era profeta (Samuel, 1,24).

 

Rei, não se inibiu Saul de se despir e de nu profetizar perante Samuel: expôs o seu corpo sem pudor e, despido, apresentou-se ante Samuel, igualmente fora de inibições. Igualmente sentiu-se confortável em manter-se desnudo durante o resto daquele dia e por toda a noite que se lhe seguiu. Do seu desnudamento e dos vaticínios que expendeu resultou a cogitação acerca de se seria profeta ou não.

 

Conquanto rei, em nada se sentiu deslustrado com a nudação na presença de terceiro e em permanecer nu por várias horas a seguir: a nudez nada lhe importava de pejorativo. Ao contrário: rei nu, profeta nu, como se fora rei e profeta vestido, tão digno na sua nudez quão estava quando vestido. A nudez não envilece.

 

A nudez em Cristo.

 

Nada expendeu Cristo antagonicamente à nudez: não a condenou, não a recriminou, não a proibiu, não exprimiu preferência pelo estado de vestido, não desviou o seu olhar de nus. Por forma nenhuma exprimiu qualquer forma de suspeita, desagrado ou recusa da nudez.

 

Nenhum ensinamento nem nenhum exemplo seu justificam nenhum anti-nudismo. Ao contrário: ressurecto, ele apareceu perante Pedro, achando-se este nu, sem constrangimento para nenhum de ambos (João, 21:7).

 

Dada a presença de Cristo, Pedro não se ruborizou nem se pejou; Cristo não se sentiu embaraçado com a nudez dele, não lhe determinou nem pediu nem insinuou que se vestisse. Pedro se cobriu porque, até então nu e aquecido com a sua faina pescatória, ao cessá-la sentiria frio: cobriu-se por conveniência térmica e não por pudor. Comportaram-se ambos com indiferença em relação à nudez de Pedro, pelo que, para Cristo, a nudez de homem perante ele não continha valor negativo de obscenidade, de erotismo, de impudor.

 

A nudez de Pedro perante Cristo não foi indecorosa, porém indiferente: eis o exemplo do filho de deus e deus ele próprio, o de que a nudez masculina, entre homens, é irrelevante e não deve constituir motivo de pejo, da parte do nu, nem de embaraço, da parte de quem o vê.

 

Pejasse-se Pedro e ele haver-se-ia coberto, o que não fez. Embaraçasse a Cristo e ele teria desviado o seu olhar ou a própria presença de Pedro, o que tampouco fez. Ao contrário, apresentou-se diante de Pedro nu e nesta condição parolaram.

 

No evangelho de Tomás (capítulo 37), os discípulos indagaram a Jesus: “Quando você aparecer-nos-á e quando o veremos?”, ao que ele lhes ripostou: “Quando vocês se tornarem como crianças e desnudarem-se sem estar envergonhados e pegarem as vossas roupas e puserem-nas sob os vossos pés e pisarem-nas vigorosamente, poderão ver o reino de deus e não terão medo”.

 

Despir-se livre de pudor e calcar os trajes com vigor era a dupla condição sob a qual os cristãos contemplariam o reino de deus e Cristo ressurrecto. Não o vestir-se nem o ocultar o corpo nem especialmente a genitália, porém, ao revés, desvestir-se de todo, fora de qualquer constrangimento, e repudiar a indumentária: ausência de vergonha como sentimento e de roupa como revestimento, eis o estado moral e material em que Cristo apareceria aos seus sequazes e a estes deparar-se-ia o reino de deus.

 

Sem roupas e com desnudamento, Cristo e o reino dos céus. Com roupas e sem desnudamento, ausência de Cristo e afastamento do reino dos céus. Não há hesitações nem alternativas; a via é uma só, a da nudez.

 

A nudez natural era o pressuposto do advento do estado celestial e da convivência com Jesus: por isto, ela não apenas é bem-vinda, desejável sem mais condições nem limitações, bendita, como necessária ao bom cristão para aceder à presença de deus e de Cristo. No céu, os cristãos estarão despidos ou, ao menos, poderão está-lo. O céu é campo de nudismo de nudez opcional, senão mesmo obrigatória.

 

O próprio Cristo apresentou-se nu, em público, duas vezes. Não há exemplo mais persuasivo do que este, o do próprio salvador exposto em pelo, perante outrem. Se Cristo apresentou-se pelado em público, autorizou, com o seu gesto e o seu exemplo, que os cristãos imitem-no; quando menos, desautorizou, com ambos, qualquer pudor e qualquer inibição.

 

Inibir-se da nudez contraria o exemplo de Cristo; envergonhar-se dela nega, diretamente, a prática dele. Sentir-se à vontade com a exposição do corpo, com a nudez natural, foi a sensação de Cristo, a sua prática, o seu exemplo, a sua lição.

 

O pudor contraria a mensagem evangélica; a naturalidade da nudez coaduna-se com ela. O verdadeiro cristão despe-se na consciência da naturalidade e da inocência da sua nudação; o mau cristão perverte a lição de Cristo; o bom cristão reproduz, nos seus costumes e na sua vida, os dele; o mau cristão nega-os por procedimentos contrários aos dele, como no caso do nudismo.

 

Cristo nudista; logo, cristãos nudistas. Cristãos pudicos, logo cristãos negadores da lição de Cristo, cristãos pecadores, cristãos confundidos pelo erro e praticantes do errado.

 

Opiniões.

 

Nada em nós pode ser impuro, afirmou S.Atanásio.

 

Não temo que esta liberdade [de nudez] propague a imoralidade. Havelock Ellis disse, com muita audácia: “Um dia, talvez, um novo reformador da moral, um grande apóstolo da pureza, aparecerá entre nós, com vergalho na mão e entrará nos nossos teatros e salas de música para purificá-los. Não é a nudez que ele expulsará; será, antes, a vestimenta! - assim opinou W.R.Inge, decano da igreja de S. Paulo, em Londres.

 

Já o padre Sertillanges disse:“O nu, em si, é casto como a natureza; ele é santo, sendo de Deus e não cabe ocultar que o é”.

 

Aos oitenta anos de idade, o pastor Henrique (Henri) Huchet acedeu ao pedido de Marcelo Kienné de Mongeot, de prefaciar o seu gracioso e instrutivo romance “O abade entre os nudistas”. Dentre mais, expendeu o prefaciador: “Se atendi ao desejo do meu amigo, Kienné de Mongeot, foi, antes, de tudo, como cristão; creio na palavra do Evangelho que proclama pela boca do Mestre: “Conhecereis a verdade e a verdade libertar-vos-á” (João, VIII, 32). A verdade verdadeira, a verdade toda nua deve libertar-nos, antes de tudo, da escravidão, da superstição do vestuário que se ensaiou justificar por uma interpretação arbitrária e falsa dos primeiros capítulos do Gênesis, em que se encontra narrada a criação de Adão e Eva” (p. 9).

 

Carlos Wojtyla, então bispo de Cracóvia, depois papa João Paulo II, em seu livro “Amor e responsabilidade”, doutrinou que “o decoro sexual não pode, de nenhuma forma, ser associado ao uso de vestuário, nem a vergonha com a ausência de roupa, a total ou parcial nudez...

 

G. Quartara, em “As leis do amor livre” (Les Lois du libre amour), citado por Marcelo Kienné de Mongeot, em “A beleza e a livre cultura” (La beauté et libre-culture), escreveu: “O direito canônico dos cristãos reduz-se a uma lenta destruição da doutrina de Jesus Cristo. Abissus abissum nivocat!

 

[...] para o crente, há poucas misérias neste mundo que o perturbem tanto quanto a leitura do direito canônico da Igreja romana. Ele contém a maior ofensa a Deus, desnatura a palavra de Jesus Cristo, acabrunha com os seus desprezos a natureza criada por Deus e degrada os orgãos genitais dados por ele à mulher e ao homem para desfrutarem sãmente da vida, por um desenvolvimento físico e intelectual apropriado pelo amor, mediante o crescimento e a multiplicação.

 

[...]

 

A história do direito canônico, das suas origens a hoje, manifesta essa regressão constante: quanto mais passa o tempo desde a morte de Jesus Cristo, tanto mais o direito canônico afasta-se dos seus mandamentos morais, divinos e jamais ultrapassados.

 

[...]

 

No desprezo da natureza, do nu, da sã satisfação dos sentidos, a mentalidade teocrática amontoou aberração sobre aberração, destruiu o cristianismo”.

 

Pondera o médico espanhol J. Palacios: “El desnudo jamás es obsceno; puede ser o no estético, pero por si es perfectamente moral” . Acrescenta: “Este daño, el de considerar la desnudez y su contemplación como un pecado, se debe al catolicismo; pero esta idea debe desterrarse en bien de la bondad, de la moral y de la belleza”.
 

 

No próximo mês a terceira e última parte desse interessante artigo.
 

 

por Arthur Lacerda

arthurlacerda@onda.com.br

19/04/15

 

(enviado em 13/05/15)


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