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Jornal Olho nu - edição N°165 - Agosto de 2014 - Ano XV

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GRAÚNA – Grupo Amazônico União Naturista - 11 anos

Carta aberta aos que conseguem entender.

As coisas por aqui continuam na mesma. Depois de uma década persistindo na ideia do despojamento das roupas só se encontrou paranoia e mistificação. E quando se pensa que está tudo bem, entra o dinheiro na jogada. Ficou muito difícil realizar o mínimo nisso tudo. Precisamos de grana para existir fora da moda, para sermos nós mesmos nessa onda consumista. O paradoxo tornou-se evidente por estas bandas do Norte, quiçá do Brasil, oxalá do mundo dos que apostam que um mundo melhor é aquele onde os bichos estão soltos. O zoológico capitalista sempre vai querer os bichos presos em dóceis gaiolas do consumismo desenfreado.

Por mais de uma década antevi uma Caravela chegando para recolher de volta as roupas dos índios. Ela veio, porém trouxe mais roupas e muitos vícios. Lindo é pensar que temos os sobreviventes desta antiga tribo, são poucos e poucas, grãos de areia neste Mar interminável.

Eu bem que gostaria de estar escrevendo algo positivo aqui, mas soaria muito, mais muito falso mesmo. Melhor é ter a certeza de continuar numa trajetória transparente, dizer das dificuldades de trazer novas gerações para esta terra dos pelad@s , da dificuldade de ter uma grana sobrando para propagar esta ideia tão antiga dos sem vestes. Não creiam que isso é um desabafo, não é não. É no máximo um bafo, sim, um esbaforir de um sopro de mais de uma década, onde nossas amizades se cristalizaram, onde percebemos que este mundo sem vestes tem sido tratado por muita gente como apanágio de fundos de investimentos. Uma infame noção de fazer os fundos de investimentos com os que mostram seus fundos.

Não era essa a tribo primordial que desejávamos vir ressurgir. Não adianta só tirar as vestes e colocar um cocar para que esta tribo ressurja. Uma cultura do corpo livre não se faz sem o espírito ancestral desarmado, com os bolsos cheios de dinheiro, com o luxo e a ostentação. Chegar de ônibus ou carrão último modelo tem o mesmo peso aqui pra banda do Norte. As coisas estão bem mais complicadas, eu insisto nisso, eu já tentei tapar o Sol com a peneira, como se para garantir uma fachada ajambrada ao que a gente da pele visível tanto ama. Chega um momento que a fachada desbota totalmente, e só não se despeja a ruína por sobre estes corpos nus porque a gente segura a parede com nosso corpo.

Eu não quero a piedade de ninguém, pois isso aqui lido não é um discurso religioso, é uma constatação. O ser humano continua com a mesma maldade no coração, com a mesma ideia de pegar um corpo nu e usar e abusar e transgredir em efêmeros jardins do paraíso. Chega o momento em que o código de ética desta tribo constrói uma cerca de jurubeba par evitar que nossas crianças sejam estupradas, para que nossas imagens não sejam vilipendiadas através de fotos de divulgação do que não queremos. Não queremos divulgar uma nudez para ser comprada, não queremos dinheiro com nossa nudez. Já deu pra entender? Melhor o anonimato que nem existe mais neste mundo virtual, está cheio de gente sem roupa neste mundo, o mundo que nos interessa é o mundo real. Chega de taras e manias de quem não tem compromisso com a tribo que não precisa de roupas para der feliz.

Eu juro que queria ter escrito algo mais alentador agora, depois de tanto tempo. O que me alegra nisso tudo? Que estamos vivos. Sim! Estamos vivos em todo encontro que promovemos, estamos planejando dentro de nossas limitações, com a pouca ajuda que temos dos raros que percebem que a pedra é muito pesada para que a gente se acabe sozinho em transportá-la. Sim, este grupo tem vivido assim, por mais de uma década, o que não é pouco, concordam? Ou nada disso vale a pena ser vivido. 11 anos, neste dia 25 de julho. Se tem um dono dessa criança é aquele índio que ficou lá pra trás, mas que está vivo sim, caminhando aos tropeços, tentando se livrar desta armadura que impuseram em seu corpo, com a chegada daquelas primeiras naus que por aqui aportaram, no Rio Amazonas, o maior do mundo, e que desde então viu suas sagradas águas sendo contaminadas por etiquetas que penetraram não só em seu corpo, mas também em seu espírito e de seus descendentes.

Jorge Bandeira- Manaus, 25 de Julho de 2014.

(enviado em 31/07/14 por Jorge Bandeira)


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