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Jornal Olho nu - edição N°100 - março de 2009 - Ano IX

 Naturalmente. De psicopatas e malvados

por Paulo Pereira*

Começo lembrando aos deslumbrados de todos os matizes que a nudez humana é externa; nascemos inteiramente nus e permanecemos nus debaixo das roupas, de todas as roupas. A natureza é soberana e não pede julgamentos!

Entretanto, os malvados (psicopatas ou não) insistem em fazer da nudez algo estranho e eventual, para dizer o mínimo. Ungewitter, no início do século XX, fez da nudez uma filosofia de vida, um culto despojado do natural. Mas em 1939, Adolf Hitler (que certamente não é do gosto da maioria, mas faz parte da história) mandou invadir a Polônia, depois de ter anexado a Áustria, recordemos. A prática nudista-naturista, que já era uma realidade, foi atingida pelos horrores da guerra, deixando a Alemanha, pátria de Ungewitter, isolada e aflita. Sem entrar aqui em análises rigorosas, seria bom convocar os irmãos naturistas a uma atenta reflexão, mais uma vez. O naturismo pode conviver com o preconceito, com a violência e com a psicopatia? Parece-me que não. Desaconselho igualmente as utopias e as heresias que, eventualmente, insinuem dialéticas insólitas. Naturismo é simplicidade e fraternidade nuas!

Contudo, e talvez para espanto de muitos, os malvados (como considera Javier Marias) constituem boa parte do contingente humano. Ah! Esse bicho-homem, esse primata tagarela, sempre surpreendente e até enigmático... As chamadas mentes doentias, ou mentes perigosas como quer a psiquiatra Ana Beatriz, são geralmente muito inteligentes e inescrupulosas, anotemos...

Em 1937, Sir Winston Churchill publica um livro extraordinário, reunindo uma boa análise de um punhado de personalidades contemporâneas dele, Churchill, com perspicácia elegância de estilo: “Great Contemporaries”, da Putnam’s Sons editora. Uma jóia histórica, premonitória e sagaz. Um dos capítulos do livro de Sir Winston é dedicado simplesmente a Adolf Hitler, sob o título de “Hitler and his choice”, (Hitler e sua escolha)... Não é de hoje que os psicopatas atormentam a humanidade! Mas muitas vezes esses “anjos maus” são exímios na arte do disfarce, das ações evasivas. Churchill salienta, por exemplo, que Hitler dedicava-se de corpo e alma a uma longa e determinada luta pela conquista do coração alemão, pela emoção de cada um, buscando alcançar friamente seus objetivos. É próprio dos psicopatas a busca incansável pelo poder, pelo status, pela notoriedade divertida e sem remorsos. O velho naturismo também foi vítima de Adolf Hitler, vítima de uma mente perigosa. A fraternidade nua incomoda especialmente os psicopatas, porque liberdade e respeito pessoal não fazem parte do dicionário dos ditadores... Churchill nos lembra que Hitler foi sempre maquiavélico, oportunista, utilizando-se de todos os meios a seu alcance para chegar aos seus fins, aos seus propósitos, inclusive usando a força bruta, ou a agressão verbal, a propaganda fria e inescrupulosa. Hoje, há até quem negue o holocausto, as câmaras de gás, as experiências biológicas ou médicas abusivas. O bicho-homem tende a desconsiderar até mesmo a sua natureza porque prioriza muitas vezes apenas o poder e a glória, transitórios, diga-se de passagem. Os malvados são piores do que os ignorantes, como nos disse Javier Marias. O naturismo nasceu como culto do natural e do respeito pelo outro. Alguns esquecem disso... Felizmente, o naturismo, no Brasil e no mundo, tem se afirmado pela ação digna e corajosa da maioria dos naturistas, talvez para desconforto dos psicopatas. Há quem se diga naturista, mas encare a nudez como algo acessório. Os exemplos dos chamados “top-less” ou “bottom-less” estão aí para quem quiser ver. Sem falar nos disparates, nas heresias histórico-filosóficas e nos transbordamentos comportamentais de uma minoria teimosa e infeliz.

A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, em “Mentes Perigosas”, vai fundo na questão da psicopatia, que é muito mais comum e real do que podemos imaginar. Na 4º capa de “Mentes Perigosas” está escrito: _ ”Frios, manipuladores, cruéis e destituídos de compaixão, culpa ou remorso. Utilizam-se de seu charme e de sua inteligência para impressionar, seduzir e enganar quem atravessa o seu caminho”...

Os psicopatas são atuantes. Os malvados, segundo Javier Marias, não se cansam facilmente. Por tudo isso, insisto, os naturistas autênticos devem ter muito cuidado, procurando dar sempre o bom exemplo. Após a derrota da Alemanha de Hitler, o naturismo voltou a se organizar com força. Em 1948, em Londres, ocorreu o primeiro grande encontro internacional de naturismo, visando, sobretudo, recuperar o tempo perdido, minimizar feridas abertas e preparar a futura criação da INF - Federação Naturista Internacional, o que aconteceria em 1953, em Montalivet. Naturismo é simplicidade, amor pelo próximo em sua verdade nua! É importante somar fraternalmente. Os egocêntricos são prejudiciais ao naturismo como um todo. Somente o respeito pelas raízes históricas, como bem destacou o ilustre Obergfell, poderá nos conduzir com serenidade e segurança do real progresso do naturismo, sem concessões cômodas, sem culto da personalidade, sem preconceitos odiosos, sem estrelismo ou messianismo. A natureza não dá saltos... Não adianta promover nenhum show de puritanismo (ou de vaidades) porque, debaixo das roupas (e das aparências) todos nós estamos inapelavelmente nus. A metamorfose da decomposição física e as cinzas da morte servem para nos alertar que a vida é cíclica, impermanente, sem lugar para egoísmos tolos.

Ana Beatriz, psiquiatra, nos esclarece que os psicopatas (como Hitler) são indivíduos que podem ser encontrados em todos os segmentos da sociedade. E, desconcertante (embora sábio e verdadeiro), Sir Winston Churchill afirma a respeito do perigoso Adolf Hitler: _ ”Todos que conheceram Hitler pessoalmente depararam-se com um homem altamente competente, frio, muito bem informado e de gestos agradáveis; ele possuía um sorriso simpático e cativante, fazendo com que poucos pudessem escapar de seu magnetismo pessoal”. Ana Beatriz observa: _ ”Os psicopatas possuem uma visão narcisista e supervalorizada de seus valores e importância. Eles se vêem como o centro do universo e tudo deve girar em torno deles. Pensam e se descrevem como pessoas superiores aos outros, e essa superioridade é tão grande que lhes dá o direito de viverem de acordo com suas próprias regras”... Dá o que pensar... Hitler não foi uma utopia, uma quimera. A sociedade vestida, por suas regras e metas, constitui muitas vezes um excelente caldo de cultura para os psicopatas, para que os psicopatas atuem impunemente. O naturismo é a negação do preconceito e do egocentrismo, de acordo com seus princípios, fundamentos e tradições. Vivamos naturalmente!

O mal veste máscaras do bem frequentemente. Os prejuízos são numerosos. Somente o bom exemplo, a presença das famílias, o fim da preguiça de ler, o respeito pelos fundamentos histórico-filosóficos e a simplicidade nua (o despojamento psicológico) poderão conduzir o verdadeiro naturista a um porto seguro. O carnaval já terminou. È hora de meditar e transcender...

Seria precioso se cada um tratasse de tirar as máscaras e rasgar as fantasias feitas de futilidades. Esqueço, então, as tribulações do cotidiano convencional e embrenho-me na floresta sempre cheia de paz e magia. Penso nos meus irmãos índios. Lembro de Aimberê e de Cunhabebe, valentes Tupinambá... É importante ouvir as vozes da mata, que infelizmente em alguns locais já anda fedendo a gente, talvez para tristeza do cacique Duwamish. Mas se cada um conseguir viver sua pequena utopia, as utopias boas virarão sonhos possíveis. Penso aqui igualmente no velho amigo Augusto Carneiro, experiente pelo tempo percorrido, lúcido, amigo da natureza, das leis naturais em lugar das leis dos homens que estudou como advogado... Carneiro faz parte do bom rebanho; é um sonhador acordado, amigo dos livros, naturista afinal. E, pensativo, recordo Paranhos, Terson Santos e Dora Vivacqua, a Luz del Fuego. Não foram meras utopias... Prossigo na trilha da floresta cúmplice. Banho-me nu na pequena cachoeira, nu como no dia em que nasci, nu como a Salomé de Del Picchia, nu como o Tupinambá sem medo, indiferente às vaidades dos ditos civilizados. Reparo que as plantas, os animais e as águas frias não notam minha nudez, nem perguntam o meu nome, a minha idade, a minha condição social, o número da minha conta bancária, a minha orientação sexual, o meu clube de futebol... O que vale é a minha energia, a minha consciência. A natureza nua (no dizer de Luz del Fuego) e a verdade natural (como proclamo em “Corpos Nus”) são a realidade que importa. Repito: que cada bom naturista saiba tirar as máscaras e rasgar as fantasias. Naturismo é simplicidade!

Paulo Pereira

Março/2009.

*ppalbion47@yahoo.com.br

(enviado em 28/02/09)


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