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Naturismo transpira a todo momento

fotos e texto por Pedro Ribeiro*

 

Maria Tereza e Francis, em passeio de barco entre as ilhas de Paraty

Os componentes do casal Francis e Tereza são aquelas pessoas que todo mundo desejaria ter como parentes próximos, tios, irmãos, avós e até mesmo pai e mãe. A serenidade e paz, que transmitem em sua convivência com outras pessoas, combinam perfeitamente com a magia do lugar que dirigem.

Ele, 65 anos, francês de nascimento, engenheiro e arquiteto, está no Brasil desde o início da década de 70, quando a empresa da qual era associado veio prestar serviços de engenharia ao governo brasileiro. Sua função era de ministrar um curso sobre segurança na prevenção de incêndios em grandes edifícios. Naquele momento o Brasil passara por dois grandes traumas: as tragédias dos edifícios Joelma e Andrauss. Gostou muito de nosso país e em 1974 abriu uma filial da empresa francesa aqui no Rio de Janeiro, da qual se tornou gerente.

E foi em uma das palestras, apresentadas em francês, sobre segurança, que conheceu Maria Tereza (hoje com 55 anos). Ela era tradutora e intérprete e trabalhava com tradução simultânea para a atenta platéia e também traduzia para o francês as questões e intervenções dos outros palestrantes e dos assistentes. Foi amor à primeira vista, ou melhor à primeira ouvida. Francis se apaixonou por Tereza por causa de sua voz e fez questão de conhecer a dona. Passaram dois anos namorando e se casaram em 1976, mesmo contra a resistência dela em celebrar o ato, pois não acreditava em casamentos. Mas Francis a convenceu.

André Herdy e Francis Breuillac no Festival Internacional de Literatura de Paraty, antes de embarcar para a Ilha do Araújo

Em 1980 renunciou ao emprego francês. O Brasil estava passando por uma série de convulsões econômicas (como de rotina) e a empresa sede decidiu fechar a filial brasileira. Foi chamado para dirigir a empresa lá, mas recusou por estar apaixonado pelo Brasil e pela brasileira. Foi então que decidiu mudar radicalmente de vida saindo da movimentada Zona Sul carioca para a encantadora Paraty, cidade a qual já conhecia e costumava visitar sempre. Procurou pelo novo lar, já com a filha Claire, que já estava com um pouco mais que uma ano de idade, e Tereza. Acabou encontrando a atual casa e o imenso terreno (que era um pouco menor na época) na Ilha do Araújo. O reveillon de 1981 já foi na nova residência.

O segundo filho, Eric, veio em 1984. A criação deles é o sonho de muitos naturistas. Ambos foram criados de maneira inteiramente natural, com muito pouco contato externo. Viviam nus e brincando com os animais da floresta. O contato externo se dava com a vizinhança na pequena ilha, parentes que os visitavam regularmente e os empregados. Até os estudos foram todos feitos na própria ilha, por correspondência, um serviço do Liceu Francês de Educação, que atende aos franceses e seus filhos em qualquer parte do mundo. Tinham regras e hábitos de estudo. Passavam a manhã e a tarde estudando, com intervalo para almoço e e recreação. Dessa forma concluíram os estudos básicos e médios. Hoje residem em Paris e estudam em universidades francesas.

O Naturismo surgiu para Francis, quando ainda morava na França. Ocasionalmente frequentava as praias da Côte D'Azur ou da Costa Brava, a partir dos anos de 1955 ou 1958, não lembra bem. A partir de 1964 e até 1976 passou a frequentar em Paris, toda segunda-feira, uma sauna que era alugada para os naturistas da região. Esse hábito foi abandonado quando decidiu morar no Brasil.

Aqui encontrou a terra que não poderia ser mais propícia para a prática do naturismo. No entanto as coisas não estavam acontecendo oficialmente. Acabava praticando somente em casa ou em raras visitas a praias desertas. Ou quando voltava à França para visitá-la.

Para Tereza, o início foi mais traumático. Ela que convivia com seu namorado então, e depois marido, não se sentia ainda à vontade para a prática. Principalmente por que antes de conhecer Francis ela teve uma experiência desagradável. Antes de ser intérprete, foi aeromoça da Air France. Em uma das viagens, um amigo da equipe do avião a convidou para visitar a Ilha do Levante, ex-colônia francesa próxima à costa da Síria. Titubeante, aceitou inicialmente mas se decepcionou ao flagrar um amigo bolinando a mulher do outro. Sem entender ainda o que era o Naturismo acabou julgando melhor recusar o convite.

O Naturismo para ela somente surgiu quando já morava na Ilha do Araújo. Três ou quatro anos depois da mudança. Durante este período foi se adaptando aos poucos usando cada vez menos roupas e apenas panos por cima da pele, enquanto que o marido e os filhos estavam totalmente ambientados. Porém havia a questão dos empregados, que não eram residentes da Ilha e iam e vinham todos os dias para trabalhar. Ela se sentia insegura e preocupada com a reação deles e o que diriam a respeito no continente. Algumas empregadas foram proibidas de trabalhar na Ilha pelos maridos e também havia resistência de alguns homens. Até encontrar uma equipe confiável foi demorado. Mas depois desse complicado período inicial de adaptação ela tornou-se uma fervorosa praticante e defensora do naturismo.

Em relação à família dela também havia certo constrangimento e quando havia visitas eles se vestiam. Mas até isso com o passar do tempo foi mudando e a aceitação veio gradualmente.

Com o passar dos anos, o modo de vida da família foi aceito pelos outros moradores locais, e Francis passou a ser conhecido com o Francês Pelado. Circulava livremente por sua propriedade, na praia e em seu barco passeando entre as outras ilhas sem qualquer tipo de problema, às vezes com seus filhos e esposa, às vezes sozinho.

Em meio a esse ambiente natural, integral e saudável no qual viviam surgiu algo inesperado e surpreendente. A filha mais velha, quando completou 12 anos, pediu à mãe para comprar um biquíni para ela. E passou a usar estas peças de roupa para ir à praia, mesmo aquela que era dentro da propriedade. E o irmão, mais novo, influenciou-se com esta decisão e acabou aderindo ao têxtil, embora os pais continuassem a viver como sempre viveram e os filhos não conheciam outra forma de convívio familiar.

O mais interessante e intrigante de tudo, que ao meu ver até mereceria um estudo psicológico, os dois filhos não são naturistas hoje em dia. Ela, com 27 anos, é casada, ele com 21, solteiro, vivem na França, o país com mais áreas naturistas do mundo.

André Herdy, Pedro Ribeiro, Maria Tereza e Francis Breuillac na sala de estar da casa.

Longe dos filhos, o casal decidiu abrir a propriedade para outros naturistas. Acredita que será uma experiência agradável e enriquecedora. Se depender deles dois, isto sem dúvida ocorrerá, pois são muitas as histórias que têm para contar e experiências para compartilhar, como por exemplo a convivência harmoniosa com os animais selvagens da ilha.

Os macacos são frequentadores habituais das varandas da casa. Vêm comer frutas nas mãos de Tereza. Mas são arredios em relação a visitantes. A convivência com humanos é pacífica, às vezes desconfiada, mas entre eles mesmos há grupos rivais e de vez em quando há gritarias e correrias pelo quintal.

Tereza adora tudo isso e conta muitas histórias sobre eles e das vezes que teve que interferir para salvar um ou outro da fúria de grupos inimigos. É a lei da selva.

O momento mais triste da vida que levaram na ilha, foi quando tiveram que se ausentar do país durante dois anos e viram seus animais de criação, cães, gatos, burro, papagaios, que viviam soltos, morrerem um a um. Deixaram os empregados cuidando, mas infelizmente o resultado foi desastroso.

Hoje em dia só possuem uma cachorro e centenas de animais silvestres, vivendo como a natureza manda.

*Editor do jornal OLHONU

pedroribeiro@jornalolhonu.com

 

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Jornal Olho nu - edição N°71 - setembro de 2006 - Ano VII


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