O Naturismo chega na Universidade

 

entrevista a Pedro Ribeiro*

 

foto: André Herdy

José Nilton, professor da UFPB, leciona uma cadeira sobre naturismo na universidade. Na foto com Pedro Ribeiro, editor do OLHO NU (clique para ampliar).

José Nilton da Silva, professor aposentado da Universidade Federal da Paraíba, voluntariamente autor de uma disciplina chamada Conhecimento do naturismo humano, 2 créditos, do curso de História, conta ao OLHO NU sobre esta disciplina acadêmica inédita em outro lugar do Brasil.

 

OLHO NU: José Nilton, diga exatamente sobre o que trata essa disciplina.

 

José Nilton: É uma disciplina oferecida aos alunos de qualquer área da universidade, qualquer aluno, qualquer curso, com o tema naturismo e meio-ambiente, parceiros de um estilo de vida, no que o aluno tenha uma noção do que seria o meio-ambiente e o que seria o naturismo, com questões relativas ao homem, à ética, ao lixo, à cidadania. Porém, o aluno não é obrigado a ficar nu, pois a disciplina não é doutrinatária. Ela é explicativa, faz com que o aluno tenha um conhecimento geral sobre o naturismo desde a Alemanha, passando pelo Brasil, pelos índios, por Luz Del Fuego, todas as áreas do naturismo.

 

O trabalho que a gente faz não obriga o aluno a frequentar sala de aula, nem fazer prova. Eles discutem e aprendem sobre o naturismo. Oitenta por cento dos alunos não entram na praia, quando fazemos visitas aqui. Vinte por cento entram, voluntariamente. E depois muitos acabam sendo frequentadores da praia de Tambaba.

 

 A disciplina tem essa abertura dentro do currículo universitário, que costuma ser muito fechado no Brasil. Oferecemos para que o aluno tenha essa visão. A visão do certo. A nudez como um hábito natural. Sem doutrinar ninguém. Uma visão humana. Por isso o nome da disciplina "Conhecimento do naturismo humano". O que é natural dentro de você. Não somos naturalistas, somos naturistas.

 

O objetivo é conversar com as pessoas. Tudo é com moderação. Não se pode exagerar. Recomendo conversar com os vizinhos. Conhecer os vizinhos. Não conhecemos o nosso corpo. Falo muito sobre estilo de vida e questiono coisas como por que nossas casas têm tantas paredes ? Para quê tantos móveis ? Tantos faqueiros ? Por quê não viver simplesmente, com poucas coisas ? por que é preciso sair vestido do seu quarto pro banheiro ? Saia nu do banheiro e vá para seu quarto. Até mesmo sozinhas as pessoas se vestem para fazer esse trajeto. Isso porque somos condicionados a usar uma roupa 24 horas por dia.

 

São essas coisas que ensinam o aluno na universidade a saber viver. Viver simplesmente, com pouca roupa, com a mente mais aberta, com respeito ao outro ao meio ambiente.

 

ON: Qual é a média do número de alunos inscritos ?

 

JN: É uma média de 15 alunos por semestre. E a frequência fica em cerca de 10 alunos. Depende da motivação. Atualmente, por exemplo, a Universidade está em greve, há poucas aulas. Não possui um microônibus disponível para fazer transporte dos alunos até aqui. Os funcionários não querem fazer o transporte porque estão em greve. Há uma série de dificuldades.

 

A maioria dos alunos entra como curioso. Eles vêm sem base alguma da escola média e da fundamental sobre esses assuntos relativos à ética. Eles têm oportunidade de ver vídeos, ver revistas. Já fiz várias incursões pela universidade.

 

ON: Houve algum tipo de recebimento negativo por parte da universidade ou de colegas ?

 

JN: Já sofri algumas repressões de alguns diretores, que dizem que eu não posso colocar nudez nas praças, nos postes e nos corredores. Mas eu faço isso porque está dentro da disciplina. E a disciplina é uma entidade autônoma.

 

Eu coloco fotos de pessoas nuas na sala de aula e há um certo rebuliço. Se fosse uma reprodução de obra de arte, não haveria problema.

 

ON: E sobre Tambaba ?

 

JN: Eu questiono muito os limites de Tambaba para a nudez. Nós tínhamos dois quilômetros e hoje temos apenas 500 metros. Perdemos 1500 metros porque as pessoas contrárias vão cobrando. E o papel da universidade deve ser esse. Questionamento. Há muitos problemas com a nudez. A universidade discuta a questão da nudez, como discute a questão da religião,  da política, da ciência. Então por que não da nudez ? Ela foi tão reprimida nestes últimos quatro séculos, que precisa ser discutida dentro da universidade. Não só internamente, mas nível geral.

 

ON: Você é naturista há quanto tempo ?

 

JM: Primeiro comecei a praticar como nudista. Não tinha noção de nada, gostava da natureza e nos anos 60, em 1965 eu já praticava a minha nudez. Somente em 1991, quando a praia (de Tambaba) foi descoberta é que comecei a praticar oficialmente.

 

Nunca quis agredir. Sempre tive vontade de ficar nas ilhas. Sempre fazia piqueniques, saía com grupos, mas não tinha essa nocão da filosofia triangular, que é uma teoria que estou desenvolvendo e esrtou escrevendo um livro a respeito. Ela diz o seguinte: O respeito a mim mesmo, respeito ao outro e respeito ao meio ambiente.

 

Quando se entra como nudista, a gente não tem respeito a nada, nem a mim mesmo, nem ao outo nem ao meio-ambiente. Fui adquirindo esse comportamento pela convivência com as outras pessoas, fui lendo revistas, livros até criar uma disciplina que está lá. É optativa, a universidade não me paga nada.

 

ON: Como têm sido os resultados desse curso para os alunos ?

 

foto: Pedro Ribeiro

José Nilton (à direita) foi mestre de cerimônias de diversas palestras ocorridas durante o V Encontro Nacional de Naturismo, em Tambaba.

JN: Os alunos gostam. Há diversos ex-alunos meus que frequentam a praia, principalmente aos domingos. Mas isso se dá aos pouquinhos. Você fala na sala de aula e só daqui a dois anos que ele vai trabalhar aquelas informações, e vai ver que eu estava correto na questão da nudez, na questão da ética e da natureza. É uma sensibilização, não doutrinação.

 

ON: Quando os alunos vêm aqui fazer o passeio pela primeira vez, já aderem ao nudismo ou ficam apenas como espectadores ?

 

JN: Eles ficam lá fora. Pergunto se alguém quer entrar para conhecer a praia. Aparece pelo menos dois ou três voluntários obedecendo a regra da praia. Os outros ficam esperando lá fora. Quando eles entram, ficam maravilhados e depois que saem dizem que vão começar a frequentar.

 

A concepção de universidade é que você não formar aquela massa ali na sala de aula. Quatro ou cinco é que vão seguir seu trabalho, o resto entra para ter um curso superior, não está muito interessado em desenvolver a ciência.

 

O ideal seria que todo aquele que procurasse a disciplina tivesse um pouco de leitura anterior sobre a nudez. Já entraria com nível melhor  e ficaria mais fácil para se discutir sobre isso. Pois sempre entram muitos que fazem aquelas perguntas triviais, como é que é lá, pode ter ereção, etc, coisas que não precisaria haver uma disciplina na universidade para responder. Poderia perguntar ali na portaria.

 

ON: Qual é o nome do livro que você está escrevendo ?

 

JN: Meu livro vai ter muitas imagens, poesias e um pouquinho da história do naturismo e de Tambaba. É um livro pequeno. É muito lento o processo, porque as pessoas ainda tem muito medo da nudez. Eu acredito que para o ano ou em um próximo encontro ele esteja pronto. Ia sair agora, mas eu não havia conseguido ainda todas as autorizações para publicação da imagens.

 

Espero que as universidades brasileiras coloquem o naturismo como disciplina. Pelo menos optativa. E não obrigar ninguém à nudez. Esperar que as pessoas reajam pelo conhecimento científico da causa.

Jornal Olho nu - edição N°62 - novembro de 2005 - Ano VI


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